Atenção aos detalhes

Alexandre Mota

Conheça-se e prepare-se adequadamente

Alguns profissionais dos mercados financeiros estão sempre de martelo na mão, pois para eles os investidores são todos iguais: “são todos um prego!” Não são, de facto. Há muitas circunstâncias que podem resultar em perfis de investidor diferentes. Desde já, num primeiro nível, a capacidade financeira e a idade do investidor, as quais influenciam o horizonte temporal ideal; segue-se, num segundo nível, a tolerância ao risco escolhida pelo investidor. Se neste último nível é verdade que há muito espaço para ensinar os investidores a tratar o risco com outros olhos, já o primeiro nível deve, sobretudo, funcionar como uma baliza na construção da carteira desse investidor. Por exemplo, um investidor com uma baixa base de ativos, necessidades financeiras superiores aos seus rendimentos e uma idade avançada dificilmente deverá desenvolver uma estratégia estilo Warren Buffett. Não porque o “Value Investing” seja uma má estratégia, mas sim porque não lhe é adequada como peça central da sua estratégia de investimento. Porquê? Porque esse tipo de estratégia entrega frequentemente resultados anuais bastante negativos, os quais podem coincidir com a necessidade de desinvestir (dado o perfil de investidor em causa e as suas necessidades financeiras) e, assim, destruir a possibilidade de recuperar nos anos seguintes.

 

Não tomar riscos é arriscado

Não existe nenhum produto financeiro sem risco, mesmo alguns produtos que são usualmente apresentados, até por profissionais, com essa característica. Por exemplo, o depósito à ordem tem o risco de insolvência do banco e as obrigações do tesouro ou similares têm o risco de insolvência do estado emitente – os depósitos não têm risco até os 100 mil euros por depositante por estarem garantidos pelo Fundo de Garantia de Depósitos, mas até neste caso podemos dizer que existe um risco de índole política, pois o FGD não tem o capital necessário para compensar todos os depósitos de cada titular em cada instituição até 100 mil euros (uma das razões para não se poder deixar o BES falir sem injetar dinheiros públicos). Neste momento, o menor risco de crédito disponível em euros são as obrigações de alguns países “core” da zona euro, pelo que investir nestas obrigações é o mais aproximado que temos de “sem risco de crédito”. Claro que o raciocínio é feito em termos nominais, porque se tomarmos em linha de conta a inflação é improvável que as obrigações permitam compensá-la. Consequentemente, para os investidores em que tal se revele adequado, as ações poderão ser a classe de ativos a privilegiar, pois é aquela que permite esperar rentabilidades reais positivas, isto é, um valor positivo da rentabilidade nominal menos a inflação.

 

Tenha atenção aos produtos estruturados de capital garantido

A construção de um produto estruturado de capital garantido consiste na combinação de um ativo de rendimento (geralmente uma obrigação soberana) com opções sobre um determinado ativo subjacente. Na montagem do produto a componente de baixo risco permite garantir a devolução do capital investido e as opções permitem alavancar a rentabilidade. A designação “garantido” poderá levar o investidor a pensar que não existem riscos, o que não é manifestamente verdade.

Por um lado, existe o risco de crédito do emitente, normalmente um banco, o que pode deitar a perder a lógica interna do produto se este banco ficar insolvente.

Por outro lado, há um custo de oportunidade, dado que 0% não é a mais alta rentabilidade disponível para o segmento de baixo risco. Se é verdade que nos últimos anos as yields das obrigações soberanas em euros estiveram abaixo de 0%, fruto do experimentalismo monetário do BCE que resultou na inflação mais alta das últimas décadas, a partir do último trimestre de 2022 passou a ser possível aplicar nesse segmento com yields positivas ao longo da curva de rendimentos. Consequentemente, os produtos de capital garantido passaram a ter um custo de oportunidade, que resulta do excesso de yield disponível face aos 0% garantidos. Estes são os riscos principais que devem ser ponderados. Acrescem outros riscos, como por exemplo: o risco de liquidez, que decorre do facto de não houver um mercado profundo para o produto em causa, o que poderá resultar em preços deslocados do valor; o risco de conflito de interesses, quer no cálculo do preço quer nos custos geralmente escondidos que estes produtos normalmente têm.

 

Vigie todos os custos

Os custos de uma carteira são uma variável a que os investidores gostam de estar atentos (e bem). No entanto, apesar dos avanços ao nível da divulgação de custos por parte das empresas de investimento, é notório, ainda, muito desconhecimento nesta matéria.

Os custos podem dividir-se em explícitos e implícitos.

Nos custos explícitos, isto é, aqueles custos que podem ser facilmente verificados num extracto de conta através de um lançamento a débito, temos:

- os custos de transação (corretagem, subscrição, resgates, comissões bancárias, etc) que só existem quando há transações

- os custos de custódia, que se aplicam ao valor sob custódia numa determinada instituição financeira

- os custos de gestão ou de consultoria, que se aplicam ao valor sob gestão ou consultoria.

Nos custos implícitos, isto é, aqueles custos que não se detectam na leitura do extracto, temos:

- spread, como por exemplo a diferença entre valor de emissão de um estruturado e o valor de subscrição do mesmo por parte do cliente – estes valores podem normalmente ser consultados no Documento de Informação Fundamental do produto na área “Quais são os custos?”

- comissões de gestão de fundos

O investidor deverá calcular e estimar estes custos de forma discriminada, procurando aferir a razoabilidade dos custos totais no contexto da sua carteira e de outras alternativas disponíveis no mercado.

 

Estude as subtilezas da fiscalidade

Os PPR são os produtos financeiros com melhor fiscalidade, seguidos dos Seguros de Capitalização, mas a sua subscrição exige alguns cuidados prévios. Em primeiro lugar, todos estes produtos estão vocacionados para o investimento a prazos médios e longos, pelo que só são adequados a investidores com essas características. Em segundo lugar, esses produtos têm custos acrescidos por comparação com a gestão da carteira fora desses veículos. Em terceiro lugar, subscrever esses produtos sem ter em linha de conta a situação fiscal de cada investidor poderá resultar numa ineficiência fiscal significativa. É o caso do investidor com um significativo reporte de perdas fiscais que opta por subscrever um seguro ao invés de usar o reporte em futuros exercícios fiscais. Por último, tratando-se, em geral, de produtos de gestão de carteira, resultam numa margem de intervenção do investidor muito baixa ou mesmo nula.

 

 

 

 

 

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